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5 de abr. de 2012

A participação da maçonaria da Guerra dos Farrapos

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A guerra dos farrapos é a guerra mais cultuada pelos gaúchos, e ao mesmo tempo a mais
 controversa das revoltas contra o império. Fato é que a tal revolução é apaixonadamente defendida pelos gaúchos e faz parte da cultura do Rio Grande do Sul de forma eloquente. Hoje se sabe que essa guerra não foi tão heroica como defendem os gauchescos de bombacha, que tomam chimarrão de manhã cedo e não abrem mão de ir à um CTG com um "bagual" (termo que se usa para chamar o cavalo aqui no RS). 

Pois bem, o site Guia do Estudante traz uma matéria muito interessante e curiosa sobre a Guerra, e enfatiza a participação da maçonaria entre os revoltosos gaúchos.

Confira nesse link a matéria da ABRIL:


Bento Gonçalves era um sportsman, o "homem perfeito para toda sorte de exercícios varonis", descreve Alfredo Varela em História da Grande Revolução. Mas a cela estreita e comprida no Forte de São Marcelo, uma ilha-prisão na baía de Todos os Santos, em Salvador, não era o melhor lugar para o encarcerado presidente da República Rio-Grandense exibir seus dotes físicos. A situação mudou quando obteve a licença dos guardas para nadar no mar - ainda que sempre vigiado. E foi nadando que, em 10 de setembro de 1837, ele fugiu de forma cinematográfica da fortaleza, reaparecendo na sua república 60 dias depois.


A articulação que permitiu tal façanha foi, supostamente, obra da maçonaria de Salvador, composta em boa parte pelos liberais responsáveis por lançar, em 1837, a Sabinada, outra das revoltas contra o Império do Brasil entre as décadas de 1820 e 40. Após 175 anos, a participação da ordem na Revolução Farroupilha ainda é um tema polêmico entre os historiadores. Os céticos negam a interferência baseados no fato de que também havia maçons imperiais. A maioria dos pesquisadores, porém, reconhece a influência, mesmo que não decisiva. A própria bandeira do Rio Grande do Sul parece dar seu testemunho, carregada de símbolos da irmandade (veja à pág. 41). Sem falar no herói atlético. O venerável mestre Bento Gonçalves dirigiu a primeira loja maçônica do estado, a Philantropia e Liberdade, em Porto Alegre. Seu nome de guerra na ordem era Sucre, uma referência ao general Antonio José Sucre, líder da libertação latino-americana ao lado de Simón Bolívar, outro maçom.

A fuga do Forte de São Marcelo é um dos episódios da insurreição em que a maçonaria teve papel mais relevante. Preso em outubro de 1836, após a derrota na batalha da Fanfa, Bento Gonçalves foi trancafiado nas infectas celas da Fortaleza de Santa Cruz e depois nas do Forte da Laje, no Rio de Janeiro, de onde tentou fugir em março de 1837. Só não conseguiu porque seu companheiro de cárcere, Pedro Boticário, por gordo que era, ficou entalado nas grades da janela da cela. Cinco meses depois, o general foi transferido para o São Marcelo. Assim que chegou a Salvador, ainda no porto, recebeu a saudação de irmãos maçons e conspiradores liberais. Abatido com a viagem, teria feito pouco caso do encontro. Dias depois, porém, emitiu um pedido de ajuda à loja local Virtude, que logo providenciou uma comissão para visitá-lo periodicamente e deu início ao plano de fuga.

Às 10 horas do dia 10 de setembro, um domingo, o general, então com 48 anos, despiu-se para o banho de mar e pôs-se a nadar - não se sabe se a regalia era fruto da sua notória capacidade de persuasão ou de influência e propinas pagas por companheiros da ordem aos vigias. Teria iniciado o exercício nadando em voltas para distrair a vigilância, mas a dada hora distanciou-se com braçadas frenéticas até atingir um baleeiro de seis remos posicionado por seus cúmplices na baía. Dois escaleres ainda saíram atrás da embarcação, que rapidamente chegou à ilha de Itaparica. O fugitivo raspou a barba para se disfarçar e foi acolhido pelos amigos conspiradores. Em 7 de outubro, após quase um mês escondido, o presidente da República Rio-Grandense embarcou em um navio comercial carregado de farinha rumo ao sul. Aportou em Santa Catarina e cumpriu o resto do trajeto até a província vizinha a cavalo, sempre com o apoio da fraternidade.

Fraude

"De todo o mito que a historiografia maçom criou, a fuga de Bento Gonçalves é o que há de mais real. Existem documentos dentro da ordem que constatam essa articulação", diz a historiadora Eliane Colussi, vice-reitora de graduação da Universidade de Passo Fundo. Especialista na maçonaria oitocentista, ela rejeita a ideia de que a irmandade tenha influenciado decisivamente a revolução. E cita pistas falsas, como a ata da reunião da loja Philantropia e Liberdade, de 18 de setembro de 1835 (difundida na internet), que teria definido as estratégias da tomada de Porto Alegre, a ofensiva inaugural do levante. "A ata é fria", admite Peri Silveira, mestre da loja Bento Gonçalves. Pesquisador em história, mesmo como membro da irmandade, ele se recusa a definir os acontecimentos como uma "revolução maçônica".

Não foi, mas também não se pode negar a participação ampla de seus representantes no lado republicano. Assim como eram maçons líderes da Independência Americana (1776), da Revolução Francesa (1789) e de tantas outras revoluções liberais. Segundo o historiador Morivalde Calvet Fagundes, autor de História da Revolução Farroupilha, a Philantropia e Liberdade foi instalada nos fundos da Sociedade Continentino, "a matriz da revolução nascente", uma agremiação em que os homens se reuniam para discutir literatura, filosofia e, claro, política.

Na sede da sociedade (e da loja), as discussões liberais fervilhavam. Ganhavam corpo diante da insatisfação dos líderes locais com o modelo centralizador da regência imperial, instituída após a renúncia de dom Pedro I, em 1831. Além de gradualmente desmobilizar guarnições militares do sul, o governo central não impunha limites à entrada no Brasil do charque uruguaio e argentino, contrariando os interesses dos produtores rio-grandenses. O descontentamento com essa situação e com o presidente da província, Fernandes Braga, eram expressos na imprensa, em periódicos muitas vezes editados por maçons. A revolta estourou em 1835.

Isso não significa, porém, que a maçonaria, como instituição, tenha se posicionado do lado farroupilha. As atividades da ordem eram incipientes na região e, sobretudo, há o registro de que vários representantes do império, como o general Sebastião Barreto, o marechal Osório e o próprio duque de Caxias, entre outros, eram maçons. Até o fim da guerra, em 1845, havia nove sedes da fraternidade na província (na frente de batalha, eram montadas lojas itinerantes). Segundo Colussi, algumas simpatizavam com a causa imperialista, como a União Geral, de Rio Grande, e a União e Fraternidade, de São Leopoldo. "No passado, quando se fundava uma loja, ela já tinha uma orientação política. Hoje, a maçonaria proíbe a discussão partidária e religiosa dentro das lojas para não criar a animosidade entre os irmãos", afirma Silveira.

Foram ainda os contatos da irmandade que levaram Giuseppe Garibaldi a se aproximar de Bento Gonçalves e dos farrapos. Fugindo de uma sentença de morte na Itália, ele desembarcou no Brasil e, por meio de amigos em comum (de sua parte, carbonários exilados. Da parte do general, maçons), uniu-se aos rebeldes, embrenhou-se nas batalhas e ajudou a fundar a República Juliana, em Santa Catarina. Mais tarde, ele mesmo seria sagrado como um integrante da ordem. 

Tradição

Ao rever o grau de interferência da sociedade secreta nos acontecimentos, é preciso levar em conta que a maçonaria costuma "se apropriar de fatos que não são dela", diz o historiador Moacyr Flores, autor de sete livros sobre a revolução. Outro que não considera seu papel determinante é o historiador José Fachel, professor da Universidade Federal de Pelotas, mas ele identifica as digitais da irmandade em eventos como a assinatura do tratado de paz entre imperiais e republicanos, em 1845. "Na anistia dos farroupilhas, visualizamos claramente acordos em função da maçonaria. Em vez de executar os vencidos, há um processo conciliatório que se dá entre irmãos maçons." Os farrapos garantiram, por exemplo, o direito de indicar o presidente da província. E esse processo permitiu que, na Guerra do Paraguai (1864), os ex-inimigos já lutassem lado a lado. Aliás, a revolta gaúcha serviu como prova de fogo e foi fonte de um grande aprendizado militar para o Exército brasileiro (leia à esq.). A paz selada em 1845 deu sobrevida ao poder imperial e ajudou a definir o Rio Grande do Sul, enfim, como parte do Brasil. A Revolução Farroupilha seria narrada como a grande epopeia gaúcha, e seus líderes, apresentados como heróis. "Sobretudo após 1935, a história da Revolução ajuda a formar a identidade do gaúcho", diz Colussi. O surgimento do movimento tradicionalista, na década de 1940, seria uma consequência disso.



Clique na imagem para ampliar (ilustração: Weberson Santiago)


Ataque surpresa

Tática de guerrilha garantiu sobrevida à insurreição

Fevereiro de 1843. Sete mil homens marcham à Fronteira Oeste da província sob as ordens de Luís Alves de Lima e Silva à caça dos farrapos. Com pressa e para ganhar agilidade, o futuro duque de Caxias, em março, deixou em São Gabriel parte da bagagem, a cavalhada e 2 mil homens. Além de precipitar o confronto, o comandante queria 14 mil cavalos dos republicanos espalhados pela fronteira. Foi em vão. Os farrapos escapuliam por caminhos que dominavam e evadiram a manada da região. Caxias teve de ir ao Uruguai comprar montaria. E os inimigos aproveitaram para atacar São Gabriel, em 10 de abril. "O desastre é completo. Toda a cavalhada é recolhida pelos rebeldes", escreve Morivalde Calvet Fagundes.

As táticas de guerrilha fizeram da Revolução Farroupilha o mais longo levante contra o império (1835-1845). As tropas farroupilhas estruturavam-se ou se dissolviam rapidamente e fugiam dos grandes embates. Pretendiam vencer pelo cansaço, atacando pequenos batalhões. O eficiente serviço de correio, inspirado no do conquistador mongol Gêngis Khan, foi decisivo. "O correio tinha prioridade no uso dos cavalos até sobre os generais", diz o coronel Cláudio Bento, presidente da Academia de História Militar Terrestre do Brasil.

Os oficiais republicanos eram basicamente estancieiros, talhados em lutas para proteger a permeável fronteira local. Em 1839, os rebeldes tinham 6903 membros de cavalaria, 2247 de infantaria e 222 de artilharia. No início, os imperiais lutavam principalmente a pé.
Para Bento, foi com base no comando de Caxias, em 1842, que o governo apostou na cavalaria e descobriu a chave para sufocar os revoltosos.

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